Para os filósofos gregos, movimento era qualquer alteração
da realidade, seja ela qual for. Sistematizando esse pensamento, o filosofo
Aristóteles elaborou oque ficou conhecido pelos filósofos medievais como teoria
das quatro causas. Ela era uma tentativa para dar explicação ao problema do
movimento, uma concepção metafísica para explicar os fenômenos naturais e
humanos. Mais oque teria a ver a concepção da casualidade com a divisão social
(lembrando que as sociedades grega e medieval distinguiam seus homens em livres
e superiores)? Muita coisa, pois o trabalho era colocado por Aristóteles como
um elemento casual secundário e inferior.
Assim começa o caminho escolhido pela filosofa e escritora
Marilena Chauí para tentar nos explicar o que é e como funciona a ideologia. No
livro “Oque é Ideologia?” (Brasiliense) ela procura dar um ênfase mais profundo
ao assunto, expondo de forma clara e objetiva a concepção que grandes
pensadores tinham do tema.
Um dos traços da ideologia é tomar as idéias como
independentes da realidade teórica e histórica, de tal modo a fazer com que
tais idéias expliquem aquela realidade, quando na verdade é a realidade que
explica essas idéias. O ideólogo seria então aquele que inverte as relações
entre as idéias e o real. Assim, a realidade se torna um processo temporal, e
esse processo depende do modo como homens se relacionam entre si e com a
natureza. Estas relações constituem as relações sociais como algo produzido
pelo próprio homem. Com isso a autora nos propõem encararmos as relações
sociais como sendo um processo histórico.
O processo histórico não é uma sucessão de fatos temporais,
não é um progresso das idéias, mais sim o modo como homens reais criaram os
meios e formas reais para a sua existência social. A historia é o movimento
pelo qual os homens instauram um modo de sociabilidade e procuram fixa-lo em
instituições determinadas, produzindo idéias pelas quais procuram explicar e
compreender a vida. No entanto essas idéias tendem a esconder dos homens o modo
real de como suas relações sociais foram produzidas. Esse ocultamento da
realidade chama-se ideologia. Por seu intermédio homens legitimam as condições
sociais de exploração e dominação, fazendo com que pareçam verdadeiras e
justas.
Assim, o termo ideologia (que no seu inicio designava uma
ciência natural de aquisição pelo homem das idéias caucadas pelo próprio real)
desiguina um sistema de idéias condenadas a desconhecer sua relação com o real.
Nesse livro podemos fazer uma breve concepção de ideologia,
partindo da visão de Augusto Comte, o pai do positivismo. Para Comte, ideologia
é sinônimo de teoria, sendo ela uma organização sistemática de todo
conhecimento cientifico. Essas teorias (ideologia) são produzidas pelos sábios
que recolhiam as opiniões, as organizavam, sintetizavam e as corrigia,
eliminando qualquer elemento metafísico ou religioso que por ventura nelas
existia. Assim a teoria (ideologia) passa a ter controle sobre a pratica dos
homens (ação), que devem se submeter aos mandamentos dos teóricos antes de
agir. Mais quem seriam esses teóricos? Encontramos-nos agora em uma sociedade
sem escravidão, onde surge um homem que se valoriza pelo seu poder econômico,
político e social. Estamos agora diante do burguês, o novo teórico dessa
sociedade, e quando as ações humanas contradisserem as idéias desses teórico,
serão tidas como desordem, um perigo para sociedade, pois o lema positivista é
“ordem e progresso”. Para Comte, só há “progresso” onde a pratica estiver
subordinada a “ordem”, e só há “ordem” onde a pratica estiver subordinada a
teoria. Assim ele alega que quem possui o saber possui o poder. Se nos
lembrarmos que não são as idéias que explicam a realidade, mais a realidade que
explica a idéias, perceberemos que a própria concepção que Comte tem de
ideologia é ideológica.
No entanto, a nova sociedade não é constituída apenas pelos
burgueses, mais ainda por outro homem, o trabalhador livre. Trabalhadores
livres num duplo sentido, pois se já não aparecem como escravos, tampouco
possuem seus próprios meios de produção e se já não são escravos, são despojado
dos meios de trabalho e precisa do burguês para trabalhar.
Partindo dessa contradição, a autora dedica mais da metade
do livro para abordar o que Karl Marx entendia por ideologia. Já de inicio
percebemos a influencia que a dialética hegeliana exerceu sobre Marx. Nessa
dialética, o filosofo Hegel definia a historia como um processo temporal movido
pela contradição e cujo sujeito é o espírito como reflexão. Essa dialética era
idealista porque seu sujeito e seu objeto era o espírito. Só que Marx era
materialista e por isso suas opiniões se chocavam com as de Hegel, mais mesmo
com tantas diferenças, Marx sofreu algumas influencias hegeliana, como a
dialética. Porem Marx demonstra que a contradição não é a do espírito (idéias),
mais sim contradição entre homens reais em condições históricas e sociais reais
e se chama luta de classe.
Partindo dessa concepção, Marx afirma que no caso da
sociedade civil capitalista, o fato dos proprietários dependerem da exploração
dos não proprietários significa simplesmente o seguinte: o capital é trabalho
não pago (mais-valia). Temos uma contradição na medida em que a realidade do
capital é a negação do trabalho.
A idéia da sociedade civil concebida como um individuo
coletivo é uma das grandes idéias da ideologia para ocultar que a realidade da
sociedade civil é a luta de classes. A ideologia é o ocultamento dessa
realidade.
Através da sociologia de Emile Durkheim, a burguesia
transforma em idéia cientifica as classes sociais, estudando elas como um fato
e não como resultado da ação dos homens. A burguesia, através de seus
intelectuais, ira produzir idéias que confirmem essa alienação fazendo, por
exemplo, que homens creiam que são desiguais por natureza ou por talento, ou
que são desiguais por desejo próprio, ou seja, os que honestamente trabalham
enriquecem e os preguiçosos empobrecem. Faz com que creiam que são desiguais
por natureza mais que a vida social, permitindo a todos a chance de trabalhar,
lhe da chances de melhorar, ocultando assim que os que trabalham não são
senhores do seu trabalho e que, portanto, suas chances de melhorar não dependem
dele, mais de quem possui os meios e condições de trabalho; ou ainda faz com
que creiam que são desiguais socialmente, mais que são iguais perante a lei e
perante ao estado, escondendo que as leis e o estado foram feitos pelos dominantes
para defender os enterneces dos dominantes..
A ideologia é um instrumento da dominação de classe e uma
das formas de luta de classe, ela é um dos meios utilizados pelos dominantes
para exercer a dominação fazendo com que esta não seja percebida pelos
dominados, fazendo com que homens creiam que suas vidas são oque são em
decorrência de ação de certas entidades desconhecidas. Seu papel é fazer com
que no lugar dos dominantes apareçam idéias “verdadeiras”, de fazer com que
homens creiam que tais idéias representam efetivamente a realidade, que creiam
que elas são autônomas (não dependem de ninguém) e que representem realidade
autônoma (não foram feitas por ninguém)
Por fim, “O que é Ideologia” é um livro claro e direto, onde
possibilita aos desconhecedores do assunto aprenderem sem maiores problemas o
significado do termo ideologia, suas interpretações, oque a torna possível e
como ela funciona. Um ótimo livro que se não aborda o tema na sua mais devida
profundidade, serve ao menos como um “primeiro passo” para se entender o tema e
questão. Mais uma bom livro de Marilena Chauí.
Referencia:
CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia? São Paulo: Brasiliense, 2001.
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