Este
livro foi escrito por Platão. Porém, a história se passa com Sócrates (o mestre
daquele). Sócrates tinha sido condenado à morte por envenenamento e, no dia da
execução da pena, alguns amigos foram visitá-lo. O livro trata, basicamente,
dessa conversa, onde Sócrates argumenta o motivo por estar tranquilo para a sua
morte.
Como
todos sabem, para Sócrates o corpo e a alma são coisas totalmente diferentes. O
corpo é visto como algo impuro, enquanto a alma como algo sem mácula. O filósofo
busca sofrer o mínimo de influência possível do corpo sobre sua alma (mente,
intelecto). Busca-se neutralidade. Sócrates parte do pressuposto de que a morte
é a separação entre corpo e alma. Assim, na morte o filósofo poderá
encontrar-se com a verdade, sem sofrer a influência de seu corpo corrupto. A morte,
por assim dizer, é o momento mais esperado na vida do filósofo (embora ele não apoie
o suicídio). Mas como saber se depois da morte, a alma também não morre?
Através do argumento do paradoxo, Sócrates aponta uma possibilidade.
Paradoxo
da natureza diz o seguinte: tudo provém de seu inverso!
1)
O sono provém da vigília (dormir); a vigília provém do sono (acordar)
2)
Algo só cresce se for pequeno; algo só diminui se for grande;
3)
Algo que se torna forte era fraco; algo que se torna fraco era forte.
4)
Algo que se torna lento foi rápido; algo que se torna rápido foi lento;
5)
Alguém que se torna corajoso tinha medo. Alguém que se torna medroso, tinha
coragem
6)
Se algo piora, é porque era melhor; Se algo melhora é porque era pior.
7)
o que se torna justo, é porque era injusto; o que se torna injusto, justo.
6)
etc. etc. etc.
Assim,
alguém que passa a estar morto é porque estava vivo. E alguém que passa a
viver, é porque estava morto. Os vivos provêm dos mortos e os mortos, dos
vivos. Portanto, pela lógica socrática, a reencarnação é totalmente lógica, não
tendo a ver com espiritualidade ou conceitos religiosos. É a razão pura. Se os
vivos não provêm dos mortos e a morte for um fim em si mesma, como então tudo
ainda não morreu? (Não leva em conta a possibilidade de uma criação contínua de
um Deus)
Outro argumento usado por
Sócrates é o do conhecimento. O conhecimento, para Sócrates (segundo Platão) é
lembrar-se de coisas que já se sabia. Em outras palavras, ninguém aprende algo
que não saiba, já que a tudo que se aprende, a princípio, podemos fazer uma
ligação com algo já sabido (construtivismo). De duas uma: ou se nasce com o
conhecimento e o conservamos durante a vida, ou então, aquilo que aprendemos
durante a vida é fruto de conhecimentos anteriores. Para ele, esta é uma prova
de que a alma vive antes de se “encarnar”. Assim, a reencarnação é uma
possibilidade para o pensamento lógico. Nascemos conhecendo o que é igualdade
(embora nunca tenhamos visto nada realmente igual na natureza). O belo e o bom
são conceitos a que comparamos todas as coisas a nossa volta, sem nunca termos
visto algo plenamente belo e bom. Aquilo que a Escritura chama de vestígios da imago
Dei, Sócrates diz que são indícios de vidas passadas, onde se adquiriu
conhecimentos inatos.
Assim,
juntando os argumentos, ele diz: “se as almas existem antes do nascimento e se,
necessariamente, para começarem a vida e existirem, não poderão provir de outra
parte a não ser da morte do que está morto, não será forçoso que continuem a
existir depois da morte, para renascerem?”
Existem
duas espécies de „coisas‟: as que mudam constantemente
(visíveis)
e as que permanecem mais imutáveis
(invisíveis).
Essas coisas que mudam constantemente podem ser destruídas por elementos
naturais, porém aquelas que não mudam, não. A alma faz parte desta segunda
classe de coisas. Assim, o corpo perece, mas a alma, para Sócrates, permanece
eternamente.
A
alma, por parecer-se com a definição divina (invisível, pura, nobre, etc.), segundo
Sócrates, vai para o lugar que se parece com ela. Assim, as almas dos filósofos
que se dedicaram a purificá-la por meio do dobrar-se sobre ela em pensamentos
(amar o saber - filosofar), tem a garantia mais segura de que irão para um
lugar divino.
A
alma é manietada em um corpo e forçada a olhar a realidade por meio dele, como
um prisioneiro olha o mundo por meio da grade. A filosofia, sutilmente,
estimula a alma a perguntar-se se a realidade que ela só consegue perceber por
meio do corpo (sentidos) é mesmo pura. O que é a verdade?
Uma
lei do carma é perceptível: as almas que entraram tanto em contato com as
imundícias do corpo, terão uma reencarnação em corpos de animais da índole de
seus vícios (glutonaria, por exemplo, ou orgulho, ou embriaguez, encarnarão em
corpos de asnos e congêneres); Do contrário, os que praticavam as virtudes,
voltam em forma de pessoas ou mesmo de animais mais sociáveis e mansas.
(abelhas, formigas, etc.)
Já os verdadeiros filósofos pertencem
ao ramo dos deuses e suas almas dobram-se em si mesmas, encontrando a verdade
pura, finalmente.
A
filosofia é vista quase que como um messias libertador, que com jeito manso,
vem mostrar a verdade. A alma aprisionada no corpo sofre, mas o maior e pior
sofrimento é aquele que se deixa de aperceber: a cegueira do senso comum.
Para
que haja vida, deve haver a alma. Assim, se há morte, não há mais alma, pois
esta não suporta a morte assim como o número três, embora não seja contrário ao
par, não o suporta por ser ímpar. O três não recebe o par, portanto será sempre
ímpar. Assim, também, se a alma não recebe a morte, logo, só recebe a vida (é
imortal). Portanto, a alma, para Sócrates (segundo Platão), é imortal.
O
ímpar, ao ver o par se aproximando eminentemente, deixa o três (que passará a
ser 4, por exemplo), mas não deixa de existir! Assim, também, a alma deixa o
corpo ao ver a morte de aproximando, mas não deixa de existir.
Dá
para perceber uma espécie de purgatório em Sócrates. Ele diz que os mortos
chegarão ao Hades e serão julgados.
Os classificados como de
procedimento mediano, dirigem-se para o Aqueronte e sobem para as barcas que
lhes são destinadas e que os transportam para a lagoa. Aí passam a residir e se
purificam, e no caso de haverem cometido alguma falta, cumprem a pena importa e
são absolvidos ou recompensados, de acordo com o mérito de cada um. Os
reconhecidamente incuráveis, por causa da enormidade de seus crimes, roubos de
templos, repetidos e graves, homicídios iníquos e contra a lei, e muitos outros
do mesmo tipo que se cometem por aí: esses lançam-nos no Tártaro a sorte
merecida, de onde não sairão nunca mais. Os autores de faltas sanáveis, embora
graves – seria o caso dos que, num momento de cólera, usaram de violência
contra o pai ou a mãe, mas que se arrependeram o resto da vida, ou os que se
tornaram homicidas por idêntico motivo – todos terão fatalmente de ser lançados
ao Tártaro. Porém um ano depois de ali caírem, as ondas jogam os assassinos
para o Cócito, e os culpados de violência contra o pai e a mão para o
Piriflegetonte. Arrastados, assim, pela correnteza, quando atingem a Lagoa
Aquerúsia, alguns clamam a vozes os que eles mesmos mataram, outros as vítimas
de suas violências; e ao acorrerem todos a seus brados, imploram permissão de
passar para a lagoa e de serem recebidos. Se conseguem, com eles que os atendam,
ingressam na lagoa, terminando logo ali seus sofrimentos; caso contrário, são
mais uma vez levados para o Tártaro e deste, novamente, para os rios, prolongando-se,
dessa forma, o castigo até conseguirem o perdão de suas vítimas. Essa pena lhes
é imposta pelos juízes. Por último, os que são reconhecidos como de vida
eminentemente santa, ficam dispensados de permanecer nessas moradas subterrâneas
terrâneas e,
como egressos da prisão atingem as regiões puras e pas-sam a residir na terra.
Entre esses, os que já se purificaram suficien-temente por meio da filosofia,
vivem daí por diante sem corpo e vão para moradias ainda mais belas do que as
outras. Desiste de descre-vê-las, a uma, por não ser fácil tarefa, à outra, por
não dispor agora de tempo para tanto. Do que vos expusemos, Símias, precisamos
tudo fazer para em vida adquirir virtude e sabedoria, pois bela é a recom-pensa
e infinitamente grande a esperança.
Mas
como ele tem certeza disso?
Afirmar, de modo positivo, que
tudo seja como acabei de expor, não é próprio de homem sensato; mas que deve
ser assim mesmo ou quase assim no que diz respeito a nossas almas e suas
moradas, sendo a al-ma imortal como se nos revelou, é proposição que me parece
digna de fé e muito própria para recompensar-nos do risco em que incorremos por
aceitá-la como tal. É um belo risco, eis o que precisamos dizer a nós mesmo à
guisa da fórmula de encantamento. Essa é a razão de me ter alongado neste mito.
Confiado nele; é que pode tranqüilizar-se com relação a sua alma o homem que
passou a vida sem dar o menor apreço aos prazeres do corpo e aos cuidados
especiais que este re-quer, por considerá-los estranhos a si mesmo e capazes de
produzir, justamente, o efeito oposto. Todo entregue aos deleites da instrução,
com os quais adornava a alma, não como se o fizesse com algo estra-nho a ela,
porém como jóias da mais feliz indicação: temperança, jus-tiça, coragem,
nobreza e verdade, espera o momento de partir para o Hades quando o destino o
convoca.
Por isso, Sócrates não tinha
medo da morte (segundo este escrito), visto ter uma esperança e um confiança
nos seus méritos, devido à sua entrega à filosofia e negação dos desejos
corporais.
Fédon,
de Platão
Análise
da obra
Neste
diálogo são abordados os momentos que precederam a morte de Sócrates, relatados
por Fédon de Elis, discípulo de Sócrates, a Equécrates.
Este
diálogo pode ser dividido nas seguintes partes:
Prólogo
(57a-60b)
Fédon
procura responder à curiosidade de Equécrates, sobre as circunstâncias em que
ocorreu a morte de Sócrates e se o mesmo acreditava nas teorias pitagóricas
sobre a metempsicose.
Capítulo
I (60b-69e)
Como
o Filosofo Encara a Morte. A Morte como Libertação
1.
Analisa-se a questão do suicídio e faz-se a sua condenação.
2.
A natureza e objeto da filosofia face à questão da morte.
3.
A morte é a separação da alma do corpo (63b-64c)
4.
A oposição alma - corpo (64c)
5.
O corpo é visto como um obstáculo que impede a alma de atingir a sabedoria
(65a-66e)
6.
A Filosofia como preparação para a morte (67d-68b)
7.
A esperança dos homens virtuosos que cultivaram a Filosofia é encontrarem no
Hades deuses, sábios e bons.
Que
espécie de morte é desejada pelos filósofos?
Qual
a razão porque o pretendem?
Capítulo
II (69d-72e)
Sócrates
começa a expor os seus argumentos sobre a imortalidade da alma
1.
A sobrevivência e imortalidade da alma (69e-70c)
2.
Uma coisa tem origem na que lhe é oposta.Á vida sucede-se a morte e a esta a
vida, e assim sucessivamente.
3.
1º.Argumento: A alternância dos contrários ou opostos prova a existência da via
para além da morte(70c-72e).
Capítulo
III
1.
A preexistência da alma em relação ao corpo
2.
2º.Argumento: A reminiscência (Anamnese) pressupõe a existência da alma
(73b-77a).
Capítulo
IV
1.
As coisas compostas estão sujeitas à decomposição, as coisas simples como a
idéia de Bem, são imutáveis e invisíveis.
2.
A teoria das Idéias
3.
3º.Argumento: A simplicidade da alma fundamenta a sua
eternidade(78d)
Capítulo
V
Os
contra argumentos de Símias e de Cebes (84c-88b): a Alma Harmonia e a
Degradação na Alma nas sucessivas reencarnações.
Capítulo
VI
1.O
objetivo de toda a pesquisa: a procura do bem
2.
O problema da Física: a causalidade
3.
4º. Argumento: A análise da causa da geração e da corrupção das coisas,
leva-nos a concluir sobre a alma como imperecível (102a-107a).
Capítulo
VIII (107d-115a)
O
Destino da Alma no Cosmos
Faz-se
uma descrição da Cosmos de forma articulada com o destino das almas.
Epílogo
(115a-118c)
O
diálogo de Sócrates com os seus discípulos é interrompido, com a chegada dos
servidores do Onze, os quais dão-lhe o veneno (cicuta) que o matará. A última
mensagem de Sócrates.
Principais questões colocadas no Fédon
Imortalidade
da alma. A
questão central deste diálogo. Platão procura dar neste diálogo uma
fundamentação filosófica da Psyké (princípio vital, alma) até então muito
envolto em concepções mágico-religiosas. Todas as provas que apresenta para a
imortalidade da alma são apoiadas na sua teoria das idéias: a) O conhecimento
como reminiscência das idéias contempladas; b) o conhecimento das idéias pela
alma demonstra a semelhança desta com aquelas; c) As coisas são o que são
devido à sua participação nas idéias.
Dualismo
antropológico.
O corpo é associado a um túmulo que aprisiona a alma e a impede de pensar-se a
si própria e a toda a realidade. A alma só o poderá fazer separando-se das
necessidades e fruições corpóreas, o que só acontecerá após a morte, na outra
vida, mas para que isso aconteça é necessário que a alma esteja preparada.
Teoria
do conhecimento. Platão começa por distinguir neste diálogo, o
mundo sensível do mundo inteligível.O primeiro só nos permite um conhecimento
aparente do mundo e portanto não um verdadeiro conhecimento. Os sentidos
constituem verdadeiros obstáculos para a alma de atingir o verdadeiro
conhecimento, o que só o poderá obter afastando-se ou libertando-se do corpo
(sentidos).A fim de garantir a possibilidade do próprio conhecimento Platão
sustentam que as coisas sensíveis são cópias (sombras) das idéias que a alma
contemplou no mundo inteligível. Quando esta reencarna num corpo trás consigo
recordações destas formas (idéias inatas), transformando deste modo toda a
aprendizagem numa recordação.
Ideias
Inatas.
O
ciclo de reencarnações da alma fundamenta a teoria da reminiscência e a do
conhecimento. Questão que emerge desta concepção: Qual o valor do conhecimento
sensível e da aprendizagem?
Isomorfismo
da Alma com o Cosmos (107d-114c). A concepção da alma em Platão,
dividida em três partes (Alma Racional, Alma Irascível e Alma Concupiscente)
tem um paralelismo na sua concepção de Estado (Polis), onde encontramos também
três funções básicas (função econômica, defensiva e legislativa), mas também na
sua concepção do cosmos onde sustenta a existência de três terras (Fédon,
Cap.VIII).
Política. A teoria
política de Platão está intimamente relacionada com a sua teoria das idéias. Só
um Estado governado por quem tem o conhecimento dos fundamentos da ordem e da
justiça, pode ser ordenado e justo.
Moral. O
renascimento das almas após a morte, sob formas desiguais, fundamenta a justiça
que transcende os homens e que os julga pelas escolhas que fizerem durante a
vida.
As
"provas" da imortalidade da alma constituem o núcleo central do
Fédon, para a fundamentação das quais serão evocadas as várias teorias (Teoria
da Idéias, da Reminiscência e da Reencarnação).
1º
Argumento: O devir faz-se através da sucessão cíclica de coisas
contrárias. Esta teoria que remonta a Heraclito. Os contrários
sucedem-se alternadamente. Do pequeno se faz o grande e do grande o pequeno. O
sonho sucede à vigília, a decomposição à composição, como a morte se sucede à
vida e esta àquela. De acordo com este princípio, a existência terrena seria precedida
de uma vida anterior oposta à morte (teoria da metempsicose). Neste processo é
contudo necessário, que algo permaneça através dos ciclos de vida e da morte: a
alma, enquanto princípio da vida.
2º
Argumento: Reminiscência. Para que alguém recorde algo, é
necessário que antes tenha aprendido.Aquilo que recordamos aprendemos
numa outra existência, na qual a lama contemplou as idéias. Platão afirma deste
modo que a alma pré-existe ao corpo e sobrevive à sua morte.
3º
Argumento: Simplicidade da alma e sua afinidade com a Idéias .
As coisas simples simples - as Idéias -, distinguem-se das compostas -os corpos
-, por serem eternas, invisíveis e imutáveis. Num homem podemos distinguir a
alma e o corpo. A alma é simples e o corpo é composto.Logo, temos que convir
que à alma pertencem todas as características que são próprias das idéias,
sendo portanto imortal.
4º
Argumento: Incompatibilidade dos Opostos. As coisas particulares do
mundo sensível tem existência e realidade quando participam nas
idéias. Mas uma coisa não pode participar da Idéia que lhe é oposta (par
no impar, calor no frio, saúde no frio, bom no mau). Ora a vida e a morte são
opostos. A alma participa na idéia de vida, logo exclui a sua idéia contrária,
a morte. A alma ao aproximar-se da morte (o seu contrário) afasta-se,
libertando-se. Podemos pois concluir que a alma é imortal.
Fontes:
PLATÃO. Diálogos: O Banquete – Fédon – Sofista –
Político (Coleção os Pensadores). 5ª ed. São Paulo: Nova
Cultural. 1991. (PDF)
- George Carlos Felten
(http://docslide.com.br/download/link/resumo-de-fedon)
- Passeinaweb:
http://www.passeiweb.com/estudos/livros/fedon
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