domingo, 23 de outubro de 2016

[Filosofia] RESUMO DO LIVRO DE PLATÃO: FÉDON, DA IMORTALIDADE DA ALMA

Este livro foi escrito por Platão. Porém, a história se passa com Sócrates (o mestre daquele). Sócrates tinha sido condenado à morte por envenenamento e, no dia da execução da pena, alguns amigos foram visitá-lo. O livro trata, basicamente, dessa conversa, onde Sócrates argumenta o motivo por estar tranquilo para a sua morte.
Como todos sabem, para Sócrates o corpo e a alma são coisas totalmente diferentes. O corpo é visto como algo impuro, enquanto a alma como algo sem mácula. O filósofo busca sofrer o mínimo de influência possível do corpo sobre sua alma (mente, intelecto). Busca-se neutralidade. Sócrates parte do pressuposto de que a morte é a separação entre corpo e alma. Assim, na morte o filósofo poderá encontrar-se com a verdade, sem sofrer a influência de seu corpo corrupto. A morte, por assim dizer, é o momento mais esperado na vida do filósofo (embora ele não apoie o suicídio). Mas como saber se depois da morte, a alma também não morre? Através do argumento do paradoxo, Sócrates aponta uma possibilidade.


Paradoxo da natureza diz o seguinte: tudo provém de seu inverso!

1) O sono provém da vigília (dormir); a vigília provém do sono (acordar)
2) Algo só cresce se for pequeno; algo só diminui se for grande;
3) Algo que se torna forte era fraco; algo que se torna fraco era forte.
4) Algo que se torna lento foi rápido; algo que se torna rápido foi lento;
5) Alguém que se torna corajoso tinha medo. Alguém que se torna medroso, tinha coragem
6) Se algo piora, é porque era melhor; Se algo melhora é porque era pior.
7) o que se torna justo, é porque era injusto; o que se torna injusto, justo.
6) etc. etc. etc.

Assim, alguém que passa a estar morto é porque estava vivo. E alguém que passa a viver, é porque estava morto. Os vivos provêm dos mortos e os mortos, dos vivos. Portanto, pela lógica socrática, a reencarnação é totalmente lógica, não tendo a ver com espiritualidade ou conceitos religiosos. É a razão pura. Se os vivos não provêm dos mortos e a morte for um fim em si mesma, como então tudo ainda não morreu? (Não leva em conta a possibilidade de uma criação contínua de um Deus)
Outro argumento usado por Sócrates é o do conhecimento. O conhecimento, para Sócrates (segundo Platão) é lembrar-se de coisas que já se sabia. Em outras palavras, ninguém aprende algo que não saiba, já que a tudo que se aprende, a princípio, podemos fazer uma ligação com algo já sabido (construtivismo). De duas uma: ou se nasce com o conhecimento e o conservamos durante a vida, ou então, aquilo que aprendemos durante a vida é fruto de conhecimentos anteriores. Para ele, esta é uma prova de que a alma vive antes de se “encarnar”. Assim, a reencarnação é uma possibilidade para o pensamento lógico. Nascemos conhecendo o que é igualdade (embora nunca tenhamos visto nada realmente igual na natureza). O belo e o bom são conceitos a que comparamos todas as coisas a nossa volta, sem nunca termos visto algo plenamente belo e bom. Aquilo que a Escritura chama de vestígios da imago Dei, Sócrates diz que são indícios de vidas passadas, onde se adquiriu conhecimentos inatos.
Assim, juntando os argumentos, ele diz: “se as almas existem antes do nascimento e se, necessariamente, para começarem a vida e existirem, não poderão provir de outra parte a não ser da morte do que está morto, não será forçoso que continuem a existir depois da morte, para renascerem?”
Existem duas espécies de „coisas: as que mudam constantemente (visíveis) e as que permanecem mais imutáveis (invisíveis). Essas coisas que mudam constantemente podem ser destruídas por elementos naturais, porém aquelas que não mudam, não. A alma faz parte desta segunda classe de coisas. Assim, o corpo perece, mas a alma, para Sócrates, permanece eternamente.
A alma, por parecer-se com a definição divina (invisível, pura, nobre, etc.), segundo Sócrates, vai para o lugar que se parece com ela. Assim, as almas dos filósofos que se dedicaram a purificá-la por meio do dobrar-se sobre ela em pensamentos (amar o saber - filosofar), tem a garantia mais segura de que irão para um lugar divino.
A alma é manietada em um corpo e forçada a olhar a realidade por meio dele, como um prisioneiro olha o mundo por meio da grade. A filosofia, sutilmente, estimula a alma a perguntar-se se a realidade que ela só consegue perceber por meio do corpo (sentidos) é mesmo pura. O que é a verdade?
Uma lei do carma é perceptível: as almas que entraram tanto em contato com as imundícias do corpo, terão uma reencarnação em corpos de animais da índole de seus vícios (glutonaria, por exemplo, ou orgulho, ou embriaguez, encarnarão em corpos de asnos e congêneres); Do contrário, os que praticavam as virtudes, voltam em forma de pessoas ou mesmo de animais mais sociáveis e mansas. (abelhas, formigas, etc.)
Já os verdadeiros filósofos pertencem ao ramo dos deuses e suas almas dobram-se em si mesmas, encontrando a verdade pura, finalmente.
A filosofia é vista quase que como um messias libertador, que com jeito manso, vem mostrar a verdade. A alma aprisionada no corpo sofre, mas o maior e pior sofrimento é aquele que se deixa de aperceber: a cegueira do senso comum.
Para que haja vida, deve haver a alma. Assim, se há morte, não há mais alma, pois esta não suporta a morte assim como o número três, embora não seja contrário ao par, não o suporta por ser ímpar. O três não recebe o par, portanto será sempre ímpar. Assim, também, se a alma não recebe a morte, logo, só recebe a vida (é imortal). Portanto, a alma, para Sócrates (segundo Platão), é imortal.
O ímpar, ao ver o par se aproximando eminentemente, deixa o três (que passará a ser 4, por exemplo), mas não deixa de existir! Assim, também, a alma deixa o corpo ao ver a morte de aproximando, mas não deixa de existir.
Dá para perceber uma espécie de purgatório em Sócrates. Ele diz que os mortos chegarão ao Hades e serão julgados.

Os classificados como de procedimento mediano, dirigem-se para o Aqueronte e sobem para as barcas que lhes são destinadas e que os transportam para a lagoa. Aí passam a residir e se purificam, e no caso de haverem cometido alguma falta, cumprem a pena importa e são absolvidos ou recompensados, de acordo com o mérito de cada um. Os reconhecidamente incuráveis, por causa da enormidade de seus crimes, roubos de templos, repetidos e graves, homicídios iníquos e contra a lei, e muitos outros do mesmo tipo que se cometem por aí: esses lançam-nos no Tártaro a sorte merecida, de onde não sairão nunca mais. Os autores de faltas sanáveis, embora graves – seria o caso dos que, num momento de cólera, usaram de violência contra o pai ou a mãe, mas que se arrependeram o resto da vida, ou os que se tornaram homicidas por idêntico motivo – todos terão fatalmente de ser lançados ao Tártaro. Porém um ano depois de ali caírem, as ondas jogam os assassinos para o Cócito, e os culpados de violência contra o pai e a mão para o Piriflegetonte. Arrastados, assim, pela correnteza, quando atingem a Lagoa Aquerúsia, alguns clamam a vozes os que eles mesmos mataram, outros as vítimas de suas violências; e ao acorrerem todos a seus brados, imploram permissão de passar para a lagoa e de serem recebidos. Se conseguem, com eles que os atendam, ingressam na lagoa, terminando logo ali seus sofrimentos; caso contrário, são mais uma vez levados para o Tártaro e deste, novamente, para os rios, prolongando-se, dessa forma, o castigo até conseguirem o perdão de suas vítimas. Essa pena lhes é imposta pelos juízes. Por último, os que são reconhecidos como de vida eminentemente santa, ficam dispensados de permanecer nessas moradas subterrâneas
terrâneas e, como egressos da prisão atingem as regiões puras e pas-sam a residir na terra. Entre esses, os que já se purificaram suficien-temente por meio da filosofia, vivem daí por diante sem corpo e vão para moradias ainda mais belas do que as outras. Desiste de descre-vê-las, a uma, por não ser fácil tarefa, à outra, por não dispor agora de tempo para tanto. Do que vos expusemos, Símias, precisamos tudo fazer para em vida adquirir virtude e sabedoria, pois bela é a recom-pensa e infinitamente grande a esperança.

Mas como ele tem certeza disso?

Afirmar, de modo positivo, que tudo seja como acabei de expor, não é próprio de homem sensato; mas que deve ser assim mesmo ou quase assim no que diz respeito a nossas almas e suas moradas, sendo a al-ma imortal como se nos revelou, é proposição que me parece digna de fé e muito própria para recompensar-nos do risco em que incorremos por aceitá-la como tal. É um belo risco, eis o que precisamos dizer a nós mesmo à guisa da fórmula de encantamento. Essa é a razão de me ter alongado neste mito. Confiado nele; é que pode tranqüilizar-se com relação a sua alma o homem que passou a vida sem dar o menor apreço aos prazeres do corpo e aos cuidados especiais que este re-quer, por considerá-los estranhos a si mesmo e capazes de produzir, justamente, o efeito oposto. Todo entregue aos deleites da instrução, com os quais adornava a alma, não como se o fizesse com algo estra-nho a ela, porém como jóias da mais feliz indicação: temperança, jus-tiça, coragem, nobreza e verdade, espera o momento de partir para o Hades quando o destino o convoca.
Por isso, Sócrates não tinha medo da morte (segundo este escrito), visto ter uma esperança e um confiança nos seus méritos, devido à sua entrega à filosofia e negação dos desejos corporais.


Fédon, de Platão



Análise da obra
Neste diálogo são abordados os momentos que precederam a morte de Sócrates, relatados por Fédon de Elis, discípulo de Sócrates, a Equécrates.
Este diálogo pode ser dividido nas seguintes partes:

Prólogo (57a-60b)
Fédon procura responder à curiosidade de Equécrates, sobre as circunstâncias em que ocorreu a morte de Sócrates e se o mesmo acreditava nas teorias pitagóricas sobre a metempsicose.

Capítulo I (60b-69e)

Como o Filosofo Encara a Morte. A Morte como Libertação 
1. Analisa-se a questão do suicídio e faz-se a sua condenação. 
2. A natureza e objeto da filosofia face à questão da morte.
3. A morte é a separação da alma do corpo (63b-64c)
4. A oposição alma - corpo (64c)
5. O corpo é visto como um obstáculo que impede a alma de atingir a sabedoria (65a-66e)
6. A Filosofia como preparação para a morte (67d-68b)
7. A esperança dos homens virtuosos que cultivaram a Filosofia é encontrarem no Hades deuses, sábios e bons.
Que espécie de morte é desejada pelos filósofos?
Qual a razão porque o pretendem?

Capítulo II  (69d-72e)
Sócrates começa a expor os seus argumentos sobre a imortalidade da alma
1. A sobrevivência e imortalidade da alma (69e-70c)
2. Uma coisa tem origem na que lhe é oposta.Á vida sucede-se a morte e a esta a vida, e assim sucessivamente. 
3. 1º.Argumento: A alternância dos contrários ou opostos prova a existência da via para além da morte(70c-72e). 

Capítulo III
1. A preexistência da alma em relação ao corpo
2. 2º.Argumento: A reminiscência (Anamnese) pressupõe a existência da alma (73b-77a).

Capítulo IV 
1. As coisas compostas estão sujeitas à decomposição, as coisas simples como a idéia de Bem, são imutáveis e invisíveis.
2. A teoria das Idéias
3. 3º.Argumento: A simplicidade da alma fundamenta a sua eternidade(78d)  

Capítulo V
Os contra argumentos de Símias e de Cebes (84c-88b): a Alma Harmonia e a Degradação na Alma nas sucessivas reencarnações.

Capítulo VI
1.O objetivo de toda a pesquisa: a procura do bem
2. O problema da Física: a causalidade 
3. 4º. Argumento: A análise da causa da geração e da corrupção das coisas, leva-nos a concluir sobre a alma como imperecível (102a-107a).

Capítulo VIII (107d-115a)
O Destino da Alma no Cosmos
Faz-se uma descrição da Cosmos de forma articulada com o destino das almas.

Epílogo (115a-118c)
O diálogo de Sócrates com os seus discípulos é interrompido, com a chegada dos servidores do Onze, os quais dão-lhe o veneno (cicuta) que o matará. A última mensagem de Sócrates.


Principais questões colocadas no Fédon

Imortalidade da alma. A questão central deste diálogo. Platão procura dar neste diálogo uma fundamentação filosófica da Psyké (princípio vital, alma) até então muito envolto em concepções mágico-religiosas. Todas as provas que apresenta para a imortalidade da alma são apoiadas na sua teoria das idéias: a) O conhecimento como reminiscência das idéias contempladas; b) o conhecimento das idéias pela alma demonstra a semelhança desta com aquelas; c) As coisas são o que são devido à sua participação nas idéias. 

Dualismo antropológico. O corpo é associado a um túmulo que aprisiona a alma e a impede de pensar-se a si própria e a toda a realidade. A alma só o poderá fazer separando-se das necessidades e fruições corpóreas, o que só acontecerá após a morte, na outra vida, mas para que isso aconteça é necessário que a alma esteja preparada.

Teoria do conhecimento. Platão começa por distinguir neste diálogo, o mundo sensível do mundo inteligível.O primeiro só nos permite um conhecimento aparente do mundo e portanto não um verdadeiro conhecimento. Os sentidos constituem verdadeiros obstáculos para a alma de atingir o verdadeiro conhecimento, o que só o poderá obter afastando-se ou libertando-se do corpo (sentidos).A fim de garantir a possibilidade do próprio conhecimento Platão sustentam que as coisas sensíveis são cópias (sombras) das idéias que a alma contemplou no mundo inteligível. Quando esta reencarna num corpo trás consigo recordações destas formas (idéias inatas), transformando deste modo toda a aprendizagem numa recordação.

Ideias Inatas.
O ciclo de reencarnações da alma fundamenta a teoria da reminiscência e a do conhecimento. Questão que emerge desta concepção: Qual o valor do conhecimento sensível e da aprendizagem?

Isomorfismo da Alma com o Cosmos (107d-114c). A concepção da alma em Platão, dividida em três partes (Alma Racional, Alma Irascível e Alma Concupiscente) tem um paralelismo na sua concepção de Estado (Polis), onde encontramos também três funções básicas (função econômica, defensiva e legislativa), mas também na sua concepção do cosmos onde sustenta a existência de três terras (Fédon, Cap.VIII).

Política. A teoria política de Platão está intimamente relacionada com a sua teoria das idéias. Só um Estado governado por quem tem o conhecimento dos fundamentos da ordem e da justiça, pode ser ordenado e justo. 

Moral. O renascimento das almas após a morte, sob formas desiguais, fundamenta a justiça que transcende os homens e que os julga pelas escolhas que fizerem durante a vida.
As "provas" da imortalidade da alma constituem o núcleo central do Fédon, para a fundamentação das quais serão evocadas as várias teorias (Teoria da Idéias, da Reminiscência e da Reencarnação). 

1º Argumento: O devir faz-se através da sucessão cíclica de coisas contrárias. Esta teoria que remonta a Heraclito. Os contrários sucedem-se alternadamente. Do pequeno se faz o grande e do grande o pequeno. O sonho sucede à vigília, a decomposição à composição, como a morte se sucede à vida e esta àquela. De acordo com este princípio, a existência terrena seria precedida de uma vida anterior oposta à morte (teoria da metempsicose). Neste processo é contudo necessário, que algo permaneça através dos ciclos de vida e da morte: a alma, enquanto princípio da vida. 

2º Argumento: Reminiscência. Para que alguém recorde algo, é necessário que antes  tenha aprendido.Aquilo que recordamos aprendemos numa outra existência, na qual a lama contemplou as idéias. Platão afirma deste modo que a alma pré-existe ao corpo e sobrevive à sua morte.

3º Argumento: Simplicidade da alma e sua afinidade com a Idéias . As coisas simples simples - as Idéias -, distinguem-se das compostas -os corpos -, por serem eternas, invisíveis e imutáveis. Num homem podemos distinguir a alma e o corpo. A alma é simples e o corpo é composto.Logo, temos que convir que à alma pertencem todas as características que são próprias das idéias, sendo portanto imortal. 

4º Argumento: Incompatibilidade dos Opostos. As coisas particulares do mundo sensível tem existência e realidade quando participam nas idéias. Mas uma coisa não pode participar da Idéia que lhe é oposta (par no impar, calor no frio, saúde no frio, bom no mau). Ora a vida e a morte são opostos. A alma participa na idéia de vida, logo exclui a sua idéia contrária, a morte. A alma ao aproximar-se da morte (o seu contrário) afasta-se, libertando-se. Podemos pois concluir que a alma é imortal.


Fontes:

PLATÃODiálogos: O Banquete – Fédon – Sofista – Político (Coleção os Pensadores). 5ª ed. São Paulo:  Nova Cultural. 1991. (PDF)

- George Carlos Felten
(http://docslide.com.br/download/link/resumo-de-fedon)

- Passeinaweb:
http://www.passeiweb.com/estudos/livros/fedon

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