quarta-feira, 4 de junho de 2014

( FILOSOFIA) ÉMILE DURKHEIM: SOLIDARIEDADE MECÂNICA E SOLIDARIEDADE ORGÂNICA



Émile Durkheim (abril de 1858 - novembro de 1917) é considerado um dos pais da Sociologia Moderna. Durkheim foi o fundador da Escola Francesa de Sociologia, posterior a Marx, que combinava a pesquisa empírica com a Teoria Sociológica. É amplamente reconhecido como um dos melhores teóricos do conceito da coesão social.
- Partindo da afirmação de que "os fatos sociais devem ser tratados como coisas", forneceu uma definição do normal e do patológico aplicada a cada sociedade, em que o normal seria aquilo que é ao mesmo tempo obrigatório para o indivíduo e superior a ele, o que significa que a sociedade e a consciência coletiva são entidades morais, antes mesmo de terem uma existência tangível. Essa preponderância da sociedade sobre o indivíduo deve permitir a realização deste, desde que consiga integrar-se a essa estrutura.
- Para que reine certo consenso nessa sociedade, deve-se favorecer o aparecimento de uma solidariedade entre seus membros. Uma vez que a solidariedade varia segundo o grau de modernidade da sociedade, a norma moral tende a tornar-se norma jurídica, pois é preciso definir, numa sociedade moderna, regras de cooperação e troca de serviços entre os que participam do trabalho coletivo (preponderância progressiva da solidariedade orgânica).
- A sociologia fortaleceu-se graças a Durkheim e seus seguidores. Suas principais obras são: Da divisão do trabalho social (1893); Regras do método sociológico (1895); O suicídio (1897); As formas elementares de vida religiosa (1912). 


Da Divisão do Trabalho Social - Solidariedade Mecânica

- Durkheim inicia sua abordagem sobre solidariedade social, levantando a seguinte questão: no que consiste o crime? Ao levantar essa questão, também é proposto pensar qual a relação existente entre o crime e a consciência coletiva. Por mais que possam parecer diferentes, segundo Durkheim, todos os crimes têm algo em comum, a prova disso é a reação da sociedade. Crimes são atos reprimidos por castigos, ou seja, a pena. Se quisermos saber em que consiste o crime, é necessário mostrar as características idênticasem todas as variedades criminológicas. É possível encontrar tal característica na relação que o crime mantém com algo que lhe é exterior. Essa relação é uma espécie de oposição entre as ações e os interesses sociais. “Embora o ato criminoso seja certamente prejudicial à sociedade, nem por isso o grau de nocividade que ele apresenta é regularmente proporcional à intensidade da repressão que recebe.” (p.41) Como também um ato pode se prejudicial à sociedade sem que haja repressão. O exemplo usado por Durkheim é o assassinato, que é considerado o mais grave dos crimes e, no entanto uma crise econômica pode ser muito mais desastrosa à sociedade. “A única característica comum a todos os crimes é que eles consistem em atos universalmente reprovados pelos membros de cada sociedade” (p.43), ou seja, ele fere com sentimentos que estão presentes em todas as consciências de um mesmo tipo social.
- É impossível determinar quais são esses sentimentos dos quais a ruptura constitui o crime, mas é possível o distinguir dos outros pelo fato de serem comuns à grande média dos indivíduos de uma mesma sociedade. “Como estão gravadas em todas as consciências, todo o mundo as conhece e sente que são fundamentais” (p.44). Isso explica porque o direito civil, presente nas sociedades modernas, determina a obrigação e a maneira como ela deve ser sancionada e, o direito penal, característico das sociedades primitivas, só edita as sanções, já que a regra é conhecida e aceita por todos. Entretanto, algo pode ferir os sentimentos coletivos sem que haja crime. Um exemplo disso é o incesto, pois causa aversão geral, mas é simplesmente imoral. “Os sentimentos coletivos a que corresponde o crime devem, pois, singularizar-se dos outros por alguma propriedade distintiva: devem ter certa intensidade média” (p.47). O direito penal atesta a força dos sentimentos coletivos, é notável por sua clareza e exatidão, enquanto as regras morais de algo de impreciso. Podemos dizer então que “o conjunto de crenças e dos sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma sociedade forma um sistema determinado que tem vida própria, podemos chamá-lo de consciência coletiva” (p.50). Logo, “um ato é criminoso quando ofende os estados fortes e definidos da consciência coletiva” (p.51).
- A solidariedade mecânica está presente nas sociedades primitivas, essas sociedades são caracterizadas por serem divididas em clãs/tribos. A consciência coletiva presente nessa sociedade está muito ligada à religião. Já a consciência individual (consciência que diz respeito ao que temos de mais distinto em relação aos outros membros da sociedade) não tem força nesse tipo de sociedade, fazendo com que os indivíduos se assemelhem já que compartilham as mesmas crenças e valores.
- O que seria solidariedade? São o que liga os indivíduos/une os elementos ao grupo. A solidariedade permite a integração da sociedade porque tem natureza moral. A função dela é manter a coesão social. Não podemos ver a solidariedade, mas segundo Durkheim, ela manifesta efeitos visíveis na sociedade. Seu efeito mais visível é o direito. A fim de determinar os tipos de solidariedade, é necessário determinar os tipos de direito que as solidariedades geram, pois o direito apresenta as convicções morais de uma sociedade. Durkheim diz que o direito divide-se em dois tipos: O direito penal e o direito restitutivo. O direito que corresponde à solidariedade mecânica é o direito penal, onde as sanções são punitivas, porque visam atingir o agente em sua honra, sua liberdade, por exemplo; visa privá-lo de algo que ele desfruta.
- Durkheim faz uma analogia com os organismos para explicar a sociedade. As moléculas sociais da solidariedade mecânica “não poderiam, pois, mover-se em conjunto, a não ser na medida em que não tem movimentos próprios, como fazem as moléculas dos corpos inorgânicos” (p.107). Por isso, o nome é Mecânica não significa que a solidariedade “seja produzida por meios mecânicos e de modo artificial” (p.107). É a “analogia com a coesão que une ente si os elementos dos corpos brutos, em oposição à que faz a unidade dos corpos vivos” (p.107).


Da Divisão do Trabalho Social - Solidariedade Mecânica


- De modo distinto (da solidariedade mecânica) existe a solidariedade orgânica que é a do tipo que predomina nas sociedades ditas "complexas" ou "modernas" do ponto de vista de maior diferenciação individual e social (o conceito é aplicado para sociedades capitalistas).

- Quando a maneira como os homens são solidários se modifica, a estrutura da sociedade não pode deixar de mudar, com isso a solidariedade mecânica que até então era a única, vai perdendo terreno para a solidariedade orgânica. Esses indivíduos além de não compartilharem dos mesmos valores e crenças, os seus interesses são bastante distintos e a consciência individual é mais acentuada.
- A divisão social do trabalho é mais desenvolvida e complexa, se expressa nas diferentes profissões e variedade das atividades industriais. Durkheim emprega alguns conceitos das ciências naturais, em particular da biologia. Muito em uso na época em que ele começou seus estudos sociológicos, com o objetivo de fazer uma comparação entre a diferenciação crescente sobre a qual se assenta a solidariedade orgânica.
- Durkheim afirma também que a divisão social do trabalho não pode ser reduzida apenas a sua dimensão econômica, no sentido que ela seria responsável pelo aumento da produção, mas, além disso, a divisão social do trabalho tem uma função moral, no sentido de que ele passar a ser o elemento chave para a integração dos indivíduos na sociedade. Também concebe a sociedade moderna como grandes organismos vivos, onde os órgãos são diferentes entre si, mas todos dependem um do outro para o bom funcionamento do ser vivo, a crescente divisão social do trabalho faz aumentar também o grau de interdependência entre os indivíduos, mas também faz crescer o sentimento de individualidade, a consciência coletiva acaba perdendo seu papel na interação social.
- Durkheim explica: “os efeitos produzidos pela divisão social do trabalho contribuem para manter o equilíbrio da sociedade” (p.95), ou seja, quanto mais o trabalho for dividido, maior rendimento terá. A coesão social não está assentada em crenças, valores sociais e religiões, mas nos códigos e regras de conduta que estabelecem direitos e deveres e se expressam em normas jurídicas, isto é, o direito restitutivo, e são essas normas que garantem a coesão social. Durkheim também explica que a sociedade não depende tanto da vigência de um sistema de crenças e sentimentos comum a todos, mas de uma moral profissional para cada atividade especializada e de normas legais que viabilizam a dependência mútua. “O direito restitutivo cria órgãos cada vez mais especiais: tribunais consulares, tribunais trabalhistas, tribunais administrativos de toda sorte. Mesmo em sua parte mais geral, a saber, o direito civil só entra em exercício graças a funcionários particulares: magistrados, advogados, etc.,que se tornaram aptos a esse papel graças a uma cultura toda especial.” (p.87) E sobre o direito restitutivo: “o direito restitutivo nada teria em comum com a solidariedade social, pois as relações que regula ligariam os indivíduos uns aos outros sem vinculá-los a sociedade”. (p.87/88)
- Segundo Durkheim, se separarmos, do direito restitutivo, as regras, o que resta “constitui um sistema não mesmo definido que compreende o direito doméstico, o direito contratual, o direito comercial, o direito processual, o direito administrativo e o constitucional”
- Mesmo o direito doméstico ser dividida em: 1)“quem é o encarregado das diferentes funções”, que responde as qualidades e condições em que ocorrem o casamento e a 2)“qual o tipo normal dessas funções e relações” responde indica quais os deveres e direitos dentro e fora do casamento. Ou seja, essa parte do direito civil é uma conseqüência do da divisão do trabalho doméstico. Segundo Durkheim “a história da família, a partir de suas origens, nada mais é que um movimento ininterrupto de dissociação, no curso do qual essas diversas funções, a principio indivisivas e confundidas umas com as outras, separam-se pouco (...) repartidas entre os diferentes parentes, segundo seu sexo, sua idade, suas relações de dependência, de maneira a fazer de cada um deles um funcionário especial da sociedade doméstica” (p.99).
- A sociedade é permeada por contratos, pois “contrato é, por excelência, a expressão jurídica da cooperação” (p.100). Mesmo os contratos que não envolvem dinheiro resultam em um compromisso, pois “cooperar, de fato, é dividir uma tarefa (p.100)” onde o contrato é o símbolo dessa troca e a troca explicita uma divisão de trabalho mais ou menos desenvolvida (p.101) e amarra uma série de outros de outros contratos.
- Outros contratos explicitam essa divisão, o comercial regulamenta as atividades no comercio e institui agentes, funções especiais, que regulamentam seu funcionamento em caso de dúvida na aplicação das regras e conciliação de interesses; o processual institui também as funções especificas para regular as regras (advogados, juízes, etc.). O mesmo ocorre com cada um dos ramos do direito: funções são criadas para regular sua aplicação. Toda a função tem certa generalidade, ou seja, vão além da consciência comum, pois é da opinião pública que vem a sua autoridade (p.104). Sendo assim, “O direito tem na sociedade um papel análogo ao do sistema nervoso no organismo” (p.105).


Podemos – em síntese dividir a solidariedade orgânica e mecânica partindo de algumas características:

Mecânica
Orgânica
Liga diretamente o individuo a sociedade
A sociedade “depende das partes que a compõem”
Conjunto mais ou menos organizado de crenças e sentimentos comuns
sistema de funções diferentes e especiais unidas por relações definidas
só pode ser forte à medida que as idéias e as tendências comuns a todos os membros da sociedade sueram em número e intensidade as que pertencem pessoalmente a eles
A consciência individual “deixa descoberta uma parte da consciência individual, para que nela se estabeleçam essas funções especiais


Fonte:

DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

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